A linguagem nossa de cada dia pode ser altamenteexpressiva. Não sei até quando sobreviverão expressões, ditados,fórmulas proverbiais, modos de dizer que atravessaram otempo falando as coisas de um jeito muito especial, gostoso,sugestivo. Acabarão por cair todas em desuso numa época comoa nossa, cheia de pressa e sem nenhuma paciência, ouapenas se renovarão?Algumas expressões são tão fortes que resistem aosséculos. Haverá alguma língua que não estabeleça formas decomparação entre vida e viagem, vida e caminho, vida e estrada?O grande Dante já começava a Divina Comédia com "Nomeio do caminho de nossa vida...". Se a vida é uma viagem, agrande viagem só pode ser... a morte, fim do nosso caminho."Ela partiu", "Ele se foi", dizemos. E assim vamos seguindo...Quando menino, ouvia com estranheza a frase "Cuidado,tem boi na linha". Como não havia linha de trem nem boipor perto, e as pessoas olhavam disfarçadamente para mim, comeceia desconfiar, mas sem compreender, que o boi era eu;mas como assim? Mais tarde vim a entender a tradução completae prosaica: "suspendamos a conversa, porque há alguémque não deve ouvi-la". Uma outra expressão pitoresca, que eujá entendia, era "calça de pular brejo" ou "calça de atravessarrio", no caso de pernas crescidas ou calças encolhidas, tudoconstatado antes de pegar algum caminho.Já adulto, vim a dar com o termo "passagem", nosentido fúnebre. "Passou desta para melhor". Situação difícil:"estar numa encruzilhada". Fim de vida penoso? "Também, jáestá subindo a ladeira dos oitenta..." São incontáveis os exemplos,é uma retórica inteira dedicada a imagens como essas.Obviamente, os poetas, especialistas em imagens, se encarregamde multiplicá-las. "Tinha uma pedra no meio do caminho",queixou-se uma vez, e para sempre, o poeta Carlos Drummondde Andrade, fornecendo-nos um símbolo essencial para todo equalquer obstáculo que um caminhante fatalmente enfrenta naestrada da vida, neste mundo velho sem porteira...
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